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segunda-feira, 12 de novembro de 2018

Yes


Sempre que alguém chega para mim e diz: “Não consigo entender teu amor pelo Yes, que bandinha bem chata!”, eu coloco uma faixa que resume o que é o Yes para mim e explico para o cidadão/ã a tal faixa, e após os 15’38” de “Awaken”, ou a pessoa já foi embora ou então deu a mão a palmatória e finalmente foi batizado pelo Espírito Prog.

“Awaken” não é apenas uma canção, é uma ode a Deus. O Yes sempre foi uma banda que primou por letras fantásticas, que falavam sobre o ser humano, Deus e contos mirabolantes como poucos. Ao lado da Van der Graaf Generator (onde Peter Hammill comandava letras assombrosas e enormemente enormes para falar sobre a vida como poucos), o Yes possui “n” canções que se encaixam perfeitamente na proposta desta seção. Até mesmo na época mais pop do grupo, canções como “Endless Dream” (do álbum Talk, de 1994) ou “I’m Running” (Big Generator, de 1987) traziam um tema que falava sobre os assuntos citados acimas, mas “Awaken” foi aquela canção onde a ideia da letra se encaixou perfeitamente com a música.

Registrada no excepcional Going for the One (1977), que marcou o retorno da segunda formação clássica do Yes, com Jon Anderson (voz, percussão, harpa, flautas), Steve Howe (guitarras, voz), Chris Squire (baixo, voz, harmônica, percussão), Alan White (bateria, piano) e Rick Wakeman (teclados), “Awaken” é dividida em três partes, as quais foram todas construídas no genial cérebro de Anderson, que apesar de ser um ótimo compositor, não tinha o mesmo talento para tocar os instrumentos, e assim, encarregou os demais membros do Yes a darem corpo ao que estava na mente do vocalista.

Anderson sempre foi um entusiasta das religiões orientais, vide o espetacular disco duplo Tales From Topographic Oceans (1973), o qual foi concebido totalmente em cima do livro de mantras Autobiography of Yogi, de Paramahansa Yogananda, e manteve todo o clima viajante em “Awaken”.

Tudo começa com uma introdução apenas ao piano de Wakeman, que prepara o terreno para os minutos seguintes. Teclados surgem como formando um universo de várias dimensões, e a voz celestial de Anderson surge falando sobre as vibrações humanas e o poder que o Sol (como um Deus) tem sobre os seres humanos, que vivem apenas em um mero planeta, a Terra.

Logo após, em uma explosão, a guitarra de Howe surge estourando os alto falantes junto com Squire e White, e entramos na canção em si, onde palavras são jogadas ao vento de forma aleatória, parecendo não fazer nenhum sentido. Mas não! Pegando o encarte e lendo como elas estão disponibilizadas, você ve que a forma como você lê as palavras (seja na horizontal ou na vertical), as frases vão fazendo sentido, que é apresentar o mundo onde a personagem principal da canção está vivendo os fatos que estão sendo narrados.

Essa personagem não tem nome, não tem sexo, não tem idade, mas pelo andar da carruagem se percebe claramente que o objetivo dela é chegar no despertar (“Awaken”), o qual é o tema central da canção. Esse despertar não é explícito dentro da letra, o que torna tudo mais interessante, pois tanto pode ser o despertar de apenas se acordar como pode ser o despertar do tipo “te liga magrão, o mundo não é como parece!”, e principalmente, implícito está o despertar para uma força maior que a da humanidade, ou seja, Deus.


Após essa primeira parte, entramos em uma longa sessão instrumental, onde Anderson assume a harpa junto com o órgão de Wakeman (o qual é realmente o órgão de uma igreja suíça onde Wakeman fez peripécias que quase o levaram a virar o organista oficial da igreja). Aqui a viagem dentro do consciente da personagem é feita de forma única. Lentamente, o tempo passa (percussão e harpa) enquanto a personagem “pensa” sobre a vida (órgão).

À medida que a personagem vai se dando de conta que ela é uma pessoa como toda qualquer, o órgão vai aumentando o ritmo das notas, enquanto o tempo passa de forma igual (mostrando que basta apenas querermos ser conscientes de nossos atos para agir da forma que é correta. O tempo é medido da mesma forma sempre).

Entramos então na terceira e última parte, onde a personagem encontra a Deus, o qual é apresentado como o Mestre das Imagens, Mestre da Luz, Mestre da Alma e Mestre do Tempo, uma rápida referência ao livro Bhagavad Gita (de onde Raul Seixas construiu a clássica canção “Gitâ”, que tem em suas frases a ideia de Deus/Gitâ estar presente em tudo na natureza) tendo ao fundo uma sonoridade grandiosa, quase que como uma orquestra inteira tocando, até chegarmos novamente ao tema inicial.

Ali, a frase “no momento em que fugia, me virei e vi que você estava parado perto de mim“, revela toda a moral da história: o perdão. A personagem cometera um ato falho, abandonando uma pessoa em um momento de dificuldade, e teve que passar por todo um processo divino para se dar conta de que a pessoa era um ser igual a ela, e que não importava onde ela estivesse, essa pessoa iria perdoá-la por que simplesmente a amava e a respeitava como um semelhante!


A profundidade de “Awaken” pode ser conferida nas apresentações ao vivo do Yes. Squire utiliza um baixo de três braços para conseguir fazer todas as partes da canção (utiliza mesmo). Fora isso, o desgaste de Howe e Wakeman fazendo os temas para dar o clima da canção, bem como a marcação precisa de White, faziam dessa uma das últimas a serem apresentadas nos shows.

No show de encerramento da turnê Union Tour, tem-se outra grande prova. Todo o show é feito em clima de festa, com Wakeman brincando e debochando o tempo todo do guitarrista Trevor Rabin e com Steve Howe totalmente insatisfeito em cima do palco. Mas na hora de “Awaken”, o clima no palco muda. Seriedade e concentração a mil, e uma execução soberba de mais uma maravilha do mundo prog é assistida pelos presentes.

Como detalhe adicional, e que poucos conhecem, a capa original de Going for the One foi proibida pela gravadora Atlantic, por achar que uma mulher nua pegaria muito mal no mercado americano. Assim, ficou a famosa capa com o homem nu de costas, mas para aqueles que não conhecem a versão original, segue a mesma.

Texto | Consultoria do Rock

1977 | GOING FOR THE ONE
(Expanded & Remastered 2003)


01. Going For The One
02. Turn Of The Century
03. Parallels
04. Wonderous Stories
05. Awaken
Bonus Tracks
06. Montreux's Theme
07. Vevey (Revisited)
08. Amazing Grace
09. Going For The One (Rehearsal)
10. Parallels (Rehearsal)
11. Turn Of The Century (Rehearsal)
12. Eastern Numbers

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